ALGUNS GRÁFICOS SOBRE DESPESA COM SAUDE E SNS
Este gráfico mostra a crescente despesa em saúde que no entanto ,pelas razões descritas no anterior post não resolveu as questões de fundo do SNS.
Nos últimos anos cresceu a despesa global com a saúde assim como a do SNS. A despesa global em saúde está acima da média da União Eutopeia mas a despesa per capita é inferior á média europeia
O aumento da despesa com medicamentos nos últimos quinze anos foi maior a nível hospitalar onde se consomem a maioria dos medicamentos inovadores. Também cresceu a despesa no ambulatório nomeadamente a despesa efectuada diretamente pelos doentes
Portugal é dos países europeus em que a despesa direta dos utentes com medicamentos(out of pocket) é mais elevada
COMO CONTROLAR A DESPESA DO SNS
Sugestões baseadas na transformação do SNS
1/5/25
Distribuição da despesa
As maiores rubricas na despesa do Serviço Nacional de Saúde(SNS) são há vários anos as despesas com pessoal e despesas com medicamentos que são cerca mais de 50% da despesa total.
A despesa com pessoal têm vindo a aumentar, não só com novas admissões nos últimos dez anos , como também devido a revisão de vencimentos, abuso na utilização de contratos precários com empresas de prestação de serviços de saúde. É uma despesa difícil de controlar. Na conjuntura atual é consensual de que um dos problemas do SNS é a falta de motivação do pessoal mais diferenciado, nomeadamente médicos, enfermeiros, farmacêuticos e técnicos superiores de saúde. A desmotivação tem razões nos valores da renumeração e aliciamento para o setor privado mas também com a desorganização das carreiras e garantias de formação, e condições de trabalho.Será assim uma rubrica de despesa que tenderá inevitavelmente de aumentar com a resolução dos problemas identificados.
Os friamente denominados “recursos humanos” são hoje, em todos os setores da sociedade, a pedra fundamental para que as organizações sejam eficientes e cumpram os seus objetivos nomeadamente os seus clientes ou utentes.
As estratégias de investigação e a o investimento na saúde pública
A nível da Saúde tem-se assistido ao domínio tecnológico da sua organização o que traz aspetos positivos na resolução de muitos problemas de saúde a montante do aparecimento das diversas patologias nomeadamente as prevalecentes (cardiovasculares, diabetes, oncológicas, músculo esqueléticas e outras). No entanto o aparecimento de muitas dessas patologias poderia se evitado com medidas de prevenção da doença e promoção da saúde.
O investimento nessa área é diminuto e Portugal é dos países europeus que menos investe nessas áreas tendo, no entanto , experiências com resultados muito positivos nomeadamente na área do controlo e diminuição tabagismo e toxidependência.
Também se têm hipervalorizado o investimento na resposta ao tratamento de doenças raras. As grandes empresas multinacionais apontaram a sua estratégia de investigação para esta área ,dada a natureza incapacitante destas doenças e pressão social, que permitem um retorno mais rápido dos investimentos efetuados. Paralelamente tem-se subvalorizado o investimento em doenças que afetam a maioria da população como sejam doenças infeciosas que a nível mundial serão a principal causa de morte. Referimo-nos o investimento em novos antibióticos, antivirais. Muitas dessas patologias poderiam ser controladas com vacinas e antibióticos e com medidas sanitárias e educação.
Alem disso como afirmámos em publicações anteriores neste Blog, a maioria da população(80%)sofre das doenças prevalecentes acima referidas , para as quais tem havido pouco investimento, estando a ser tratadas fundamentalmente com medicamentos genéricos, isto é medicamentos com patente caducada. Nesta área tem surgido interessantes processos de investigação incremental e tecnológica que melhoram a adesão á terapêutica prescrita e efetividade do medicamento .Estes processos são no entanto pouco valorizados pelas entidades financiadoras .Também os estudos em ambiente de vida real (real word studies) complementados com os convencionais ensaios clínicos ,têm permitido serem aprovadas novas indicações terapêuticas para moléculas antigas( repurposing ) mas que no entanto na nossa opinião não têm sido suficientemente valorizadas pelas autoridades financiadoras.O caso paradigmático é o da Talidomida retirada do mercado há cerca 70 anos e hoje com indicações major no tratamento da Lepra e algumas patologias oncológicas.
Evolução das tecnologias na saúde
As tecnologias tem vindo a tornar-se cada vez mais complexas. Por um lado, tem-se assistido ao esbatimento das distinções entre as formas tecnológicas “clássicas” através da introdução de associações de medicamentos a dispositivos médicos (por exemplo, os stents) ou de equipamentos de imagiologia que permitem, simultaneamente, a realização de intervenções cirúrgicas e, por outro, têm sido desenvolvidas técnicas sofisticadas, designadamente a nível das terapêuticas celulares e com tecidos, da fármaco-genómica e da nanotecnologia que têm colocado novos e difíceis desafios que exigem uma compreensão cientifica profunda dos processos e métodos de avaliação da segurança, eficácia e efetividade destes emergentes instrumentos tecnológicos.
Estes problemas agravar-se-ão no futuro quando, como é previsível, as terapêuticas forem cada vez mais individualizadas na sequência da aplicação de técnicas associadas à genética.
Como é natural, esta crescente complexidade da tecnologia foi acompanhada pelo aumento acentuado dos custos e da despesa, sobretudo pública, por o modelo europeu de protecção social se basear no acesso universal das populações aos cuidados de saúde. Saliente-se, porém, que mesmo que se tentasse restringir o usufruto das inovações pela população, esse esforço não teria, provavelmente, grande sucesso porque, para além do mais, as inovações têm tido como objetivo, especialmente, a gestão de patologias órfãs ou de estádios terminais das doenças, situações em que a implementação de um racionamento explicito (sobretudo quando os novos instrumentos terapêuticos são eficazes) é muito difícil.
Paralelamente, a rapidez com que a informação sobre os novos instrumentos tecnológicos tem sido disseminada e o valor social que a população lhes atribui leva a que seja exercida grande pressão para a sua adopção cada vez mais rápida, inevitavelmente financiada pelo Estado dado o seu elevado custo.
Um fator acelerador desta dinâmica tem sido o envelhecimento da população. Com efeito, sendo os idosos particularmente sensíveis a todos os factores que possam contribuir para o prolongamento da vida e tendo aumentado acentuadamente o seu peso na sociedade, é natural que o poder político seja particularmente sensível à evolução tecnológica na Saúde (Breyer, Costa-Font e Felder, 2010).
Assim, as tecnologias de saúde têm contribuído significativamente para o crescimento das despesas como o atestam alguns trabalhos publicados. Com efeito, numa análise pioneira, Mechou-se (1992) estimou que a tecnologia foi responsável por mais de metade da taxa de crescimento da despesa em Saúde nos EUA entre 1950 e 1990. Mais recentemente, o mesmo autor e colegas (Smith, Newhouse e Freeland, 2009) refizeram os cálculos e estimaram que 27% a 48% do ritmo de crescimento da despesa seria atribuível à tecnologia que constituiria, conjuntamente com o aumento do rendimento, o principal fator explicativo deste fenómeno.
Note-se que a contribuição da tecnologia para a evolução da despesa está correlacionada com a variação do rendimento como é demonstrado neste último artigo. Paralelamente, como se referiu já, o envelhecimento da população decorrente, entre outros fatores, do prolongamento da esperança de vida e, consequentemente, do aumento do nível de vida e da utilização da tecnologia, é um factor gerador de procura acrescida de cuidados cada vez mais caros (Canadian Health Services Research Foundation, 2011).
Assim, existe interacção entre os vários fatores causadores de pressão sobre a despesa sendo o principal, contudo, como potencial causador de ineficiência, a evolução tecnológica (Breyer, Costa-Font e Felder, 2010).
Com efeito, a gestão da maior parte das situações causadas pelo envelhecimento pode ser feita a custos relativamente pouco elevados pela alteração do padrão de tratamento das doenças, passando da intensidade tecnológica para os cuidados continuados (Canadian Health Services Research Foundation, 2011). Paralelamente, numa primeira analise, o aumento da despesa induzido pela variação do rendimento não é mais do que o reflexo do valor que os consumidores atribuem aos cuidados de saúde, não existindo, neste caso, desperdício (de acordo com a teoria económica tradicional) porque o montante despendido corresponderia à disposição dos doentes a pagar pelos cuidados consumidos.
Contudo, o problema põe-se exatamente aqui porque, para que isto aconteça, é necessário que quem paga (sejam os doentes ou o SNS) conheça os benefícios associados ao seu consumo. Com a sofisticação crescente das tecnologias, é cada vez mais difícil saber-se com rigor, em primeiro lugar, quais são estes benefícios e, depois, se eles compensam o custo. É fundamentalmente por esta razão que é necessária a avaliação das tecnologias, tanto clínica como económica. Alias, antes mesmo da avaliação económica começar a dar os primeiros passos já se sentia a necessidade da avaliação clínica ser muito mais rigorosa, refletido no movimento que deu origem à Rede Cochrane (Aranda da Silva; Gouveia Pinto 2015)
Que estratégia e que soluções.
1- Tem de existir uma estratégia para o desenvolvimento do Sistema de Saúde e em particular do Serviço Nacional de Saúde (SNS), que tenha em conta o enquadramento da Constituição da República e que seja baseada nas necessidades do doente ao longo dos seu percurso de vida ,adaptando as formas da prestação de cuidados a esse percurso.
Essa estratégia tem de ser discutida, aprovada e publicada e publicitada para que possa ser avaliada permanentemente.
2- A jusante das intervenções e utilização de tecnologias para tratamento das patologias, deve estar presente de forma organizada e permanente a prevenção das doenças, através de promoção da saúde e de estilos de vida saudáveis, de ações de despiste precoce , organizado de forma coordenada nos vários níveis da estrutura do SNS.Tem de ser promovida a literacia em saúde com propostas concretas a nível das diversas instituições sociedade desde os locais de trabalho ao sistema educativo.
3- A organização do SNS tem de ter em conta a imprescindibilidade da integração dos diversos níveis e tipos de cuidados de saúde, através de equipes pluridisciplinares e com novos modelos de governação que tenham em conta novo tipo de financiamento com responsabilização e descentralização das decisões.
4- Deve-se ter em conta a colaboração complementar do setor privado e social de forma transparente e baseado num sistema de informação em saúde eficiente, auditável e que respeite e beneficie os cidadãos e os seus direitos.
5- Deve ser melhorado o sistema de avaliação das tecnologias de saúde através do reforço do papel do INFARMED. Tem de ser dotado de maior autonomia financeira para gerir os recursos que não estão dependentes do OE provenientes da cobrança de taxas e prestação de serviços a organizações internacionais .Deve ser atribuído um estatuto legal adequado á missão específica que desempenha, de forma a poder manter e desenvolver a sua capacidade científica e capacidade de interferência nas decisões Europeias .como aconteceu na últimas três décadas.
Jose Aranda da Silva
Sustentabilidade do SNS Medicamentos. “Quo Vadis” INFARMED
Os medicamentos de acordo com dados da OCDE constituem cerca de 20 % dos gastos totais em saúde.
Nos últimos anos a parte mais significativa desta despesa, realiza-se com a utilização de medicamentos a nível da rede pública hospitalar.
Trata-se de novos medicamentos considerados inovadores, uma parte significativa para doenças consideradas por regulamento como raras.
Constituem cerca de 80% da despesa pública com medicamentos.
A esmagadora maioria dos medicamentos consumidos pelos portugueses, tanto a nível hospitalar como no ambulatório, são considerados essenciais, na sua maioria medicamentos genéricos, constituem 20% da despesa e destinam-se a patologias prevalentes como as cardiovasculares (hipertensão, dislipidemias, anticoagulantes),diabetes, doenças do sistema nervoso.
(Aranda da Silva 2025).
Os medicamentos inovadores exigem por parte do INFARMED uma rigorosa avaliação da sua efetividade para serem financiados pelo SNS.
São avaliados através dum Sistema denominado SINATS com cerca de 15 anos (www.infarmed.pt)
As decisões são baseadas em pareceres de diversos peritos, farmacologistas, médicos de diversas especialidades, farmacêuticos de diversas áreas, estatistas, economistas da saúde.
Desde 2025 que parte desta avaliação está a ser efetuada a nível europeu com a participação de peritos de diversos Estados Membros.
O governo assinou no final de Março um acordo com a APIFARMA que estabelece um teto anual de crescimento da despesa com medicamentos de 7%.
Trata-se de um crescimento acima do crescimento do PIB e pretende ter em conta o peso dos custos com a inovação terapêutica. O acordo tem provocado alguma contestação por parte de algumas empresas, nomeadamente as pequenas empresas inovadoras que para se consolidarem no mercado, precisam de maior crescimento para manterem rentável a operação.
As empresas fabricantes de medicamentos, que em Portugal ultrapassaram o ano passado os 4000 milhões de euros nas exportações, vêm de um modo geral dados positivos no acordo.
Algumas grandes empresa têm levantado dúvidas sobre a aplicabilidade do acordo.
Aspetos pouco transparentes são os procedimentos que no entanto se mantêm, como a confidencialidade dos preços acordados nos contratos. Trata-se de um procedimento pouco compreensível quando se fala em mercado único.
Esta situação tem levado a que alguns países ,tenham apresentado propostas nas reuniões de Ministros da Saúde, para realização de concursos públicos a nível europeu para alguns medicamentos de forma a se baixarem os preços de forma harmoniosa , aproveitando-se a experiência efetuada com a aquisição de vacinas durante a recente pandemia.
Estes acordos são assinados regularmente há mais de vinte anos com os governos visando controlar de forma administrativa o crescimento da despesa.
É no entanto importante referir, que para se controlar a despesa com medicamentos não bastam medidas administrativas que têm efeito a curto prazo. Não alteram o consumo para um padrão mais racional, equitativo e seguro na utilização dos medicamentos.
O INFARMED devia ser dotado de mais recursos humanos técnicos e científicos de forma a aumentar a sua capacidade de avaliação e fiabilidade das avaliações. As decisões seriam assim melhor fundamentadas e não se baseando a critérios administrativos de contenção de custos , que podem prejudicar ou facilitar sem fundamentos adequados o acesso a medicamentos inovadores.
O INFARMED não depende do Orçamento do Estado e gera receitas significativas sendo parte importante desviada pelo Ministério das finanças para outros fins.
O estatuto do INFARMED, que pouco tem evoluído nas últimas dezenas de anos, retira grande autonomia á gestão financeira e dos recursos humanos a um Instituto com capacidade financeira autónoma. O controlo do Ministério das Finanças é incompreensível e não permite a utilização dessas verbas.´ de referir que medidas tomadas estes últimos meses reforçaram o recrutamento de pessoal.Se não fôr alterado o seu estatuto, como muitos outros profissionais passarão pelo médio prazo do infarmed para o setor privado como tem acontecido ultimamente.
Aliás são de louvar os esforços dos profissionais e dirigentes que ”contra ventos e marés” têm mantido o INFARMED a funcionar mantendo seu prestígio a nível internacional mesmo tendo dificuldades em cumprir prazos e a qualidade científica das avaliações efectuadas.
Desde o ano passado, por diversas vezes, foi anunciado publicamente pelo atual governo, que o INFARMED ia ser dotado de um novo estatuto , não se tendo concretizado essa promessa até á recente queda do governo que provocou a convocação de eleições em Maio.
Um novo estatuto , como aconteceu noutras instituições do Ministério da Saúde permitiria a sua reorganização e capacidade de utilizar as receitas que gera ,através de pagamentos de serviços prestados a organizações internacionais como a Agencia Europeia do Medicamento e OMS ,assim como de taxas que recebe relacionadas com a comercialização dos medicamentos e cosméticos.
O governo não aprovou a nova lei orgânica, pelo que nas condições existentes é legitimo pôr em causa a capacidade de avaliação científica e controlo da despesa, baseada em critérios científicos e capacidade de resposta aos desafios resultantes da nova legislação europeia publicada nos últimos dois anos.
Esperamos que os partidos, que estão neste momento a elaborar os seus programas eleitorais, tenham em conta esta realidade e proponham medidas de reforma que incluam um novo estatuto pra o INFARMED.
As medidas recentemente aprovadas por portaria e decisão regulamentar da Direcção estão muito longe de terem impacto significativo na alteração do “Status Quo”.
José Aranda da Silva
FALANDO DE MEDICAMENTOS
Inovadores , Genéricos , Essenciais e Abandonados
Têm havido dificuldades no acesso a alguns medicamentos inovadores, nomeadamente em oncologia e medicamentos para doenças raras. Nalguns casos também em alguns medicamentos para a diabetes, doenças cardiovasculares e infeciosas. Sendo inovadores e resultado da investigação recente de um ou mais laboratórios, ao aportar um valor relevante para as patologias a que se destinam, apresentam naturalmente preços diferenciados quando são inicialmente lançados no mercado. No entanto têm de ser aperfeiçoados tornados mais transparentes processos de avaliação destas tecnologias, como está em curso a partir deste ano após publicação de nova legislação Europeia.
As empresas farmacêuticas, enquanto entidades privadas, pretendem recuperar tão rapidamente quanto possível os avultados investimentos efetuados e satisfazer assim o interesse dos seus acionistas. Em muitos casos, o preço inicialmente proposto tem sido considerado demasiado elevado por parte das autoridades responsáveis pela avaliação das tecnologias de saúde (ATS). É assim frequentemente exigido que para lá da qualidade, segurança e eficácia (certificada pela Agência Europeia do Medicamento ou outras agências nacionais ) seja provada a custo-efetividade destas intervenções. Isto é, quando comparadas com outras alternativas terapêuticas já existentes no mercado, representam um investimento em que há uma fundada expetativa proporcional de retorno em termos de benefícios em saúde. Este processo, até aqui exclusivamente de responsabilidade nacional , atrasa nalguns casos o acesso desses medicamentos aos doentes.A fase experimental em curso de avaliação nível Europeu poderá trazer resultados positivos .Não raras vezes a demora na chegada ao mercado deve-se precisamente às divergências entre fornecedor e autoridade em relação ao preço a praticar e ao desenrolar do processo de aproximação entre as partes.
Recordemos no entanto que a maior parte da população que utiliza medicamentos (cerca de 80%) está dependente de medicamentos essenciais que hoje, na maior parte dos países, são medicamentos denominados medicamentos genéricos. Referimo-nos a medicamentos cuja patente caiu no domínio público, podendo assim ser comercializados por diversos fabricantes, para lá do laboratório responsável pela primeira colocação no mercado.Uma grande maioria dos medicamentos para doenças previdentes na sociedade como a diabetes, hipertensão, dislipidémias e diversas doenças cardiovasculares, que são as doenças com maior morbilidade e mortalidade em Portugal e nos países desenvolvidos, são hoje comercializados sob as condições que atrás descrevemos. Podendo ainda acrescentar-se alguns medicamentos para doenças respiratórias, oncológicas e outras menos representativas.Estes medicamentos, denominados de medicamentos genéricos, que consideramos essenciais em termos de saúde pública pelo elevado número de doentes que os utilizam, têm tido falhas no mercado devido a uma polícia de preços que desvaloriza a sua importância. Muitos destes medicamentos são hoje de melhor qualidade que os originais como consequência das inovações tecnológicas que têm sido introduzidas quer nas matérias primas utilizadas como ma s novas tecnologias introduzidas no processo de fabrico.As formulações desses medicamentos introduzem muitas vezes novas dosagens mais ajustadas á realidade e necessidades do tratamento. Alem de melhorarem a sua qualidade trazem muitas vezes vantagens para a utilização mais racional e melhorias para os doentes no que se refere a adesão terapêutica. Estas inovações tecnológicas devem ser valorizadas pois um medicamento não é só a substância ativa(que isoladamente pode não ter qualquer efeito) mas também a incorporação tecnológica incorporada na sua formulação e processo de fabrico.
Temos ainda um grupo de medicamentos que sendo essenciais deixaram de ser fabricados e que denominamos de “medicamentos abandonados” (“neglected medicines”, na expressão adotada pela OMS). Alguns desses medicamentos têm tido roturas no abastecimento, o que se revela particularmente preocupante quando atinge fármacos sem qualquer alternativa terapêutica, como recentemente aconteceu com a Hidrocortisona, substância essencial em diversos protocolos de tratamentos oncológicos, sendo também de salientar outros casos importantes em doenças raras.
Em Portugal a gravidade desta situação acentuou-se dado o brutal esmagamento dos preços dos medicamentos essenciais efetuados nos últimos 15 anos (muitos deles são hoje mais baratos que um mero pacote de pastilhas elásticas ou tomar um café), o que desincentivou a produção e estimulou as exportações para outros países de preços mais altos e mais exigentes quanto á qualidade do produto final i idoneidade do fabricante.
Temos de ter a noção que a globalização teve alguns aspetos positivos, nomeadamente na velocidade da comunicação da informação científica e nas comunicações em geral, mas trouxe, por outro lado alguns aspetos perversos, que aqui, no caso que retratamos, podemos considerar a deslocalização da produção de medicamentos e das suas substâncias ativas (API), essencialmente a partir dos anos 90 do século passado, para a China e India.
Não é um sector único neste aspeto, pois o mesmo aconteceu com outros produtos como os têxteis e os equipamentos eletrónicos, por exemplo. Até o final do século passado, grande parte das matérias-primas e medicamentos acabados que eram produzidos na Europa ou nos EUA. Actualmente muitos deles são produzidos na China e India e outros países tendo -se favorecido o desenvolvimento da indústria nesses países à custa dos muito baixos custos da mão-de-obra e da inexistência de sistemas de proteção social. Hoje, praticamente apenas os medicamentos inovadores (grande parte de origem biológica), são produzidos nos países mais desenvolvidos.
As políticas da União Europeia, privilegiando o apoio ao sistema financeiro e a medidas de liberalização da concorrência, subestimaram a importância dos impactos sociais dessas medidas e fragilizarem a capacidade de a Europa ser auto-suficiente em áreas estrategicamente importantes.
Portugal no entanto desenvolveu nos últimos vinte anos a sua capacidade instalada de fabrico de medicamentos de elevada qualidade e com incorporação de significativa inovação tecnológica na formulação e processo de fabrico. Recentemente o Ministro da Economia anunciou que a exportação de medicamentos para mercados europeus e EUA ultrapassou os 4 mil milhões de Euros.
A nível da UE, temos no terreno duas instituições sólidas e importantes, particularmente neste momento, com a participação de todos os Estados Membros. A Agência Europeia do Medicamento (EMA), criada em 1995 após decisão na presidência portuguesa em 1992, com apoio de cerca de 6000 peritos de todos os Estados Membros (mais de 150 são Portugueses) (www.ema.europa.eu).
O Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC), criado em 2004, com a participação de todos Estados Membros acompanha diariamente a evolução das diversas epidemias e emite recomendações (www.ecdc.europa.eu).
Estas Agências contrariam a tendência dominante na EU de se reduzir a ela própria ao controlo das finanças públicas e da concorrência, ou valorizando funções que ultrapassam o âmbito dos tratados como é o caso da defesa , menorizando o seu papel na defesa da saúde pública. previsto nos tratados .São impostas sem base legal, não apoiadas apoiadas nos tratados, políticas que, em última análise, põem em causa o próprio desenvolvimento económico dos Estados Membros e em vez de tornarem a União Europeia num exemplo de conquistas sociais e de Paz, pretendem retomar acções belicistas sem sentido , que só interessam ás indústrias de armamento dos EUA e alguns países Europeus.
José Aranda da Silva
A SAÚDE DOS PORTUGUESES. O SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE (SNS) O AGORA DENOMINADO SISTEMA NACIONAL DE SAÚDE
Evolução dos Sistemas de saúde
A criação dos sistemas de protecção social no século XIX, nomeadamente na Saúde, resultou em grande medida da necessidade do desenvolvimento económico e aumento de competitividade das economias do centro da Europa na sequência da Revolução Industrial. Não era possível o desenvolvimento económico sustentado com uma força de trabalho fragilizada e com fraca produtividade. Em meados do século XX, o desenvolvimento económico resultante da reconstrução Europeia está associado à organização de sistemas de saude por toda Europa com figurinos Bismarkianos, Beveridgeanos ou, na esmagadora maioria dos casos, mistos. Com efeito, muito poucos sistemas actuais (se é que algum) têm todas as características dos modelos iniciais pois evoluíram ao longo do tempo, adaptando-se às condições sociais, económicas e políticas, com complexidade variável e diferentes ritmos de crescimento.
Nas últimas décadas, o modelo de bem-estar social Europeu foi um paradigma para muitos países de diversos continentes. Os sistemas de saúde tiveram uma responsabilidade significativa nesta situaçõo ao contribuírem decisivamente, em particular, para o aumento da esperança de vida e a diminuição da mortalidade infantil, que tiveram, na Europa, uma das evoluções mais notáveis a nível Mundial.
Mas o crescimento da oferta de serviços de saúde e o aumento da procura geraram, a partir dos anos oitenta, uma tendência de crescimento da despesa em saúde superior ao crescimento global da economia. Com efeito, o peso da despesa pública no PIB aumentou acentuadamente na União Europeia (Aranda da Silva;Gouveia Pinto;Cadernos de Saúde e Sociedade Diário de Bordo 2011)
Em Portugal a Constituição da República no seu artigo 64º consagra a criação de um Serviço Nacional de Saúde(SNS) universal geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos ,tendencialmente gratuito com gestão descentralizada e participada.
Para atingir estes objetivos é importante que o poder político ,tenha em conta as especificidades de uma organização complexa ,com mais de cem mil trabalhadores da sua maioria licenciados e doutorados.
Trata-se de um sistema que teve bons resultados, quantificáveis com diversos resultados em saude dos quais se referem habitualmente a diminuição espetacular da mortalidade infantil e aumento muito significativo da esperança de vida á nascença.
A despesa com a saúde e com o SNS tem vindo a crescer nos últimos anos ,salvo no período de intervenção da”Troika”.
A crise financeira de 2007-2008 levou a que muitos países efetuassem cortes nos sistemas públicos de saúde. Como referia o Professor Constantino Sakellarides:
“O mundo que temos hoje é um produto direto da forma como foi gerida a crise financeira de 2008, uma crise gerida de forma imediatista, ignorando aquilo que eram conhecimentos essenciais sobre economia, sociedades e nosso bem-estar”.
Em muitos países, os sistemas de saúde foram, durante demasiados anos, sujeitos e restrições financeiras com graves danos para o seu funcionamento, com perda e desmotivação dos seus profissionais e degradação dos seus equipamentos. Apesar de se registar, nos últimos anos, recuperação do investimento nos sistemas de saúde de diversos países, constata-se que ainda há um longo caminho a percorrer para reparar os danos infligidos. Podemos, no entanto, afirmar que os países com maior investimento público nos sistemas de saúde foram aqueles que melhor deram resposta à crise.
O recente relatório do Observatório do SNS define de forma clara a natureza do SNS e os pressupostos. para a resolução dos problemas que têm perturbado o seu funcionamento.
Infelizmente o ambiente “catrastofista” induzido pela comunicação social na procura diária de notícias ,que ponham em causa os governos, tanto o anterior como atual, não ajudam ao debate sereno e procura de soluções efetivas, para a defesa da maior conquista social ,para alem da liberdade de expressão que é o nosso SNS.
A questão da literacia em Saúde está na ordem do dia e devia estar incluída nas estratégias dos diversos governos.
“O Serviço Nacional de Saúde (SNS) não é uma organização como qualquer outra – incorpora,“geneticamente” uma dimensão ética, a da inclusão, e outra afetiva, a da pertença – é nosso património comum, de todos os portugueses.
Como todas as propostas generosas do nosso compromisso social, enfrenta, na sua evolução,grandes desafios que é necessário superar continuamente. Não se trata de “construir” uma nova organização e “já está feito”! É indispensável instituir um processo de transformação contínua que responda aos desafios que um mundo em mudança invariavelmente suscita.
1.1. O compromisso
Como referido no capítulo anterior, o desenvolvimento do sistema de saúde português é sustentado pelo compromisso resumido no Quadro 1.
Quadro 1. O compromisso: corresponder às necessidades, expectativas e aspirações das pessoas,relativas à sua saúde, com o apoio do seu “Serviço Nacional de Saúde” que as cuida, serve e empodera,complementado, de acordo com uma estratégia cooperativa explicita, pelo setor privado social e pelo setor privado com fins lucrativos.
Este compromisso resulta da evolução do sistema de saúde português nas últimas décadas eencontra-se expresso na Constituição da República Portuguesa. O sistema de saúde português
– não o Sistema Nacional de Saúde ou o Sistema Português de Saúde (não existe qualquerinstituição portuguesa que corresponda a estas designações) – com um Serviço Nacional de Saúde como sua principal referência, o seu centro de gravidade.
1.2. Como conseguir realizar o “compromisso”?
Desenhar e implementar políticas de saúde, tendo em conta o contexto em que se situam, de acordo com o “Estado da Arte” do conhecimento sobre o desenvolvimento do sistema de saúde.
Para se poder olhar, analiticamente, para o passado recente e para a atualidade do sistema de saúde e do SNS, é necessário explicitar expectativas quanto ao que deverá acontecer se o estado da arte do conhecimento, neste domínio, for devidamente tido em conta na realização do “compromisso social contratual”.Num contexto, em que a comunicação com a vasta audiência que pode beneficiar deste exercício é muito importante, a capacidade de proceder a uma síntese legível do do estado da arte sobre esse conhecimento, é essencial.”
A leitura atenta deste documento acessível no site da fundação para a Saúde e neste Blog , foi objeto de discussão no grupo de Saúde da Assembleia da República em fevereiro assim como com organizações Profissionais
Jose Aranda da Silva
1 Março 2025
Porquê um Blog
Com cerca de 60 anos de intervenção política, cultural , profissional e académica, pareceu-me oportuno utilizar uma nova forma de comunicação com os amigos ,colegas, companheiros, camaradas e com o público em geral.
Amigos como o Pedro Pita Barros ou o Zé Manuel Catarino Soares têm um Blog que vou acompanhando , assim como de outros amigos como os ”ladrões de bicicletas” e muitos outros.
Pendurado no blog está um repositório do que foi a minha vida ,académica, militar, política e profissional com alguns dos trabalhos publicados em revistas científicas ,jornais e revistas, entrevistas na TV, trabalhos apresentados em congressos e outro tipo de intervenções públicas. Muitos dos trabalhos estão somente descritos no CV pois não houve possibilidade de digitalização.
Espero que tenha leitores e que interajam comigo